KARINA CILENE BRUSAROSCO
Advogada, Especialista em Direito Penal e Processual Penal Militar pela Universidade Cruzeiro do Sul e Chefe do Departamento Administrativo da Oliveira Campanini Advogados Associados.
I – INTRODUÇÃO
Este artigo tem por objeto a discussão acerca da aplicação dos princípios constitucionais da ampla defesa, do contraditório, do devido processo legal, entre outros menos importantes, mas que devem ser citados, no âmbito do processo administrativo disciplinar militar.
Cumpre inicialmente destacar que diante do cometimento pelo policial militar de prática de ilícitos administrativos, cabe ao Poder Publico proceder às devidas apurações do ato ilícito, aplicando ou não a punição cabível.
Por fim, o ponto crucial deste tema é a observância dos princípios constitucionais no processo administrativo, para que não haja nulidade dos atos já praticados.
II – PROCESSO ADMINISTRATIVO NO ESTADO DE SÃO PAULO
A Policia Militar do Estado de São Paulo, seguindo os preceitos estabelecidos pela Constituição Federal, permite aos policiais militares estaduais, acusados da prática de ilícitos administrativos, o exercício da ampla defesa e do contraditório, e a presença de advogados nos quartéis, sub-sedes da Policia Militar e nos atos processuais.
A competência disciplinar do Poder Público consiste no dever-poder de apurar ilícitos administrativos e aplicar penalidades às pessoas que se vinculam, de alguma forma, à Administração Pública; assim observa-se que o poder do Estado de punir seus agentes deve ser exercido, quando necessário, mas deverá sempre ser apurado por meio de um processo adequado (princípio do devido processo legal).
Comprovada a falta disciplinar, os infratores serão punidos de forma efetiva, para exemplo à tropa, inclusive com a demissão e expulsão, se for o caso, mas com o exercício da garantia da ampla defesa e do contraditório, previstos no art. 5º, e também observados os princípios previstos no art. 37, “caput”, ambos da Constituição Federal, presentes em toda atividade administrativa.
As I- 16 PM, instruções que cuidam do processo administrativo disciplinar da Polícia Militar do Estado de São Paulo, no art. 2º , caput, prescreve expressamente que: “O processo administrativo reger-se-á pelas normas contidas nestas Instruções, respeitados os preceitos constitucionais e administrativos, a legislação específica, os atos normativos do Governo do Estado, do Secretário da Segurança Pública e os Convênios”
Assim podemos concluir que, inevitavelmente, deve-se observar os preceitos constitucionais, atitude que dará validade aos atos.
A aplicação dos princípios constitucionais ao processo administrativo não significa a quebra de preceitos, mas o fortalecimento do ato administrativo, que levado ao Poder Judiciário dificilmente será modificado, uma vez que preenche os requisitos estabelecidos em lei.
Segundo Romeu Felipe Bacellar Filho, “O princípio da ampla defesa, aplicado ao processo administrativo disciplinar, é compreendido de forma conjugada com o princípio do contraditório, desdobrando-se:
a) no estabelecimento da oportunidade da defesa, que deve ser prévia a toda decisão capaz de influir no convencimento do julgador, aqui no caso, é o direito a ampla defesa;
b) exigência de defesa técnica, ou seja, possibilidade do acusado ser acompanhado por seu advogado, durante o tramite;
c) no direito à instrução probatória que, se de um lado impõe à Administração a obrigatoriedade de provar alegações, de outro, assegura ao servidor a possibilidade de produção probatória compatível, ou seja, o servidor pode e deve apresentar provas para provar sua inocência;
d) na previsão de recursos administrativos, garantindo o duplo grau de exame no processo, ou seja, poderá recorrer da decisão.
Estes requisitos são necessários para concretização do princípio do devido processo legal previsto no art. 5º, LIV.
Portanto, de acordo com o acima exposto, o acusado de uma infração disciplinar, terá a oportunidade de apresentar sua defesa e comprovar suas alegações mediante provas, no desenvolvimento do processo administrativo.
Assegurando-se a ampla defesa e o contraditório, o instituto da verdade sabida se torna inconstitucional, pois, esta consiste na mera verificação direta e pessoal do cometimento de uma infração administrativa pela autoridade, que detém competência para aplicar sanção e a imediata imposição da respectiva pena. Assim não existindo ampla defesa e contraditório, qualquer penalidade estabelecida será considerada nula, tornando-se assim, a verdade sabida inconstitucional.
Explicados resumidamente os princípios do contraditório e ampla defesa, passaremos agora aos outros princípios a serem observados, que são: princípios da legalidade, tipicidade, oficialidade, eficiência.
Inicialmente está o princípio da legalidade, que estabelecerá tanto a descrição do ilícito administrativo quanto a sanção a ser imposta.
A posteriori, está o princípio da tipicidade, que consistirá na necessidade de que os comportamentos reprováveis estejam descritos como tal, por uma norma legal, atuando como uma garantia aos cidadãos para ciência das condutas admitidas ou não pelo ordenamento.
Já o princípio da oficialidade, demonstra que compete a Administração o impulso de ofício do processo, ou seja, a autoridade que tiver conhecimento da infração no serviço público estará obrigada a realizar a apuração imediata.
No que tange a eficiência, esta depende diretamente da escolha dos membros que irão compor a comissão processante, pois deverão ser indicados servidores responsáveis e conscientes e que sejam naturalmente imparciais.
Em suma, a finalidade do processo disciplinar não é só aplicar a penalidade, mas também permitir a apresentação de resposta pelo acusado a qualquer denúncia efetuada dentro da Administração Pública, esclarecimentos de fatos, e a eventual aplicação de penalidades, uma vez verificada a responsabilidade administrativa de algum agente.
III – INQUÉRITO ADMINISTRATIVO
No inquérito administrativo, ocorre em primeiro lugar a instrução, onde é assegurado o contraditório e ampla defesa, após esta, se for tipificada a infração, o servidor será indiciado com especificação dos fatos a ele imputados e das respectivas provas, em seguida será citado para se defender; por fim o inquérito terminará com relatório conclusivo.
A própria autoridade instauradora do processo proferirá o julgamento, salvo se a penalidade exceder à sua alçada.
Não podemos esquecer ainda, o princípio da proporcionalidade, que é observado na aplicação das penalidades.
IV – CONCLUSÃO
De acordo com o exposto, fica claro que o art. 5º, da CF, é norma fundamental e estabelece garantias que devem ser aplicadas ao processo judicial e administrativo; assim o ato processual ou administrativo deve preencher as formalidades e requisitos estabelecidos em lei, para que tenha validade e para que seja efetiva a aplicação das sanções. (contraditório e ampla defesa).
No que tange ao devido processo legal, este fortalece o ato praticado pelo julgador, pois a decisão deste, não faz coisa julgada no âmbito da administração, pois dificilmente esta decisão será revista pelo Poder Judiciário.
No processo administrativo deverão ser observados os princípios constitucionais, sem que isso acarrete a quebra dos poderes outorgados à administração pública, que deve punir os infratores de forma exemplar, inclusive com a demissão, expulsão, perda de cargo, independente de sua posição funcional.
Já o inquérito que foi abordado de forma resumida, há que se ressaltar, que também se observa os princípios do contraditório e ampla defesa, a própria autoridade julgadora profere a decisão e por fim, aplica-se o principio da proporcionalidade no que tange a aplicação das penas.
Em suma, devem-se aplicar as penalidades necessárias, porém sempre se observando os princípios constitucionais, para que não ocorram nulidades ou invalidade de atos executados.
BIBLIOGRAFIA
BACELLAR FILHO, Romeu Felipe. Princípios Constitucionais do Processo Administrativo Disciplinar. São Paulo: Max Limonad, 1998, p. 347
BACELLAR FILHO, Romeu Felipe. Direito Administrativo. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 88.
COSTA, Alexandre Henriques da, e outros. Direito Administrativo Disciplinar Militar. São Paulo: Suprema Cultura. 1ª Edição. Págs. 278/279.
GUIMARÃES, Deocleciano Torrieri. Dicionário Técnico Jurídico. Editora Rideel.
MARTINS, Eliezer Pereira. Direito Administrativo Disciplinar Militar e sua Processualidade. Leme: Editora Direito, 1996, p.86.
Fonte: Departamento de Estudos Científico-Doutrinários da OCAA